Com o título “E a justiça calou a imprensa para proteger um juiz…”, eis artigo de Paulinho Oliveira, jornalista e servidor do Poder Judiciário do Ceará. Ele lamenta a decisão de juiz que proibiu O POVO de mencionar nome de magistrado envolvido em suposto esquema de venda de decisões judiciais. Confira:
O crime do Jornal O POVO, de Fortaleza, foi dar publicidade a um fato público e notório. Um magistrado de primeira instância da capital cearense era investigado como um dos envolvidos no suposto esquema de venda de decisões judiciais. De repente, uma decisão do juiz da 10ª Vara Cível de Fortaleza, José Coutinho Tomaz Filho, referenda a censura. Por meio de liminar, determina que o Jornal O POVO pare de citar o nome do dito juiz investigado (F. C. B. A.), sob pena de multa diária no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais).
Interessante esse aspecto da justiça brasileira. Quando a imprensa, por exemplo, divulga investigações e ilações mil, por exemplo, sobre Luís Inácio Lula da Silva, aí pode. “Lula é proprietário do sítio de Atibaia!” “Lula é proprietário do apartamento no Guarujá!” Documentos surgiram para provar o contrário? Pouco importa. Nada de reparação proporcional ao agravo ao ex-presidente agredido em sua honra – ao contrário, a justiça considera improcedente ação de danos morais de Lula contra a revista Veja. O que importa é sua culpa antecipada – incluindo capa com o ex-presidente vestido de presidiário.
Para isso, a justiça fecha os olhos.
Quando se tratou, de outra sorte, de malhar em praça pública a agora ex-presidente Dilma Rousseff, a justiça, por intermédio de Sérgio Moro – o justiceiro paranaense -, cuidou de, inclusive, divulgar conversa privada e absolutamente normal entre Dilma e Lula. Grampeou telefones de advogados, violou e segue violando garantias constitucionais, tudo com o propósito de criminalizar o Partido dos Trabalhadores, fornecendo combustível suficiente para a consagração do golpe que levou Michel Temer e sua curriola ao poder. Eduardo Cunha, com claro desvio de função, conduziu na Câmara o início de um processo mais que questionável de impeachment.
Para isso, também, a justiça fecha os olhos.
Há uma articulação no Congresso Nacional para o envio a plenário de um Projeto de Lei que visa tipificar o crime de abuso de autoridade por parte de agentes públicos como juízes e promotores de justiça. O procurador federal Deltan Dallagnol – árduo combatente da corrupção -, então, foi fazer lobby no gabinete do relator do projeto na Câmara, Onyx Lorenzoni (DEM-RS), que, rapidinho, tirou do projeto o texto que falava de punições a magistrados e membros do Ministério Público.
Para manobras como a de Dallagnol, igualmente, a justiça fecha os olhos.
Juízes, procuradores, desembargadores, promotores, ministros, todos recebem auxílio-moradia, hoje valorado em mais de 5 mil reais mensais. Todos têm moradia, até mais de uma. Em partes nobres de suas respectivas cidades de habitação. Enquanto isso, a desigualdade social aumenta, o déficit habitacional também, e as autoridades judiciárias, melindradas, não querem mexer em seus nababescos privilégios.
Para isso, também, a justiça cega.
Agora, para proteger a “honra” de um juiz que é apenas citado em reportagens como investigado – que realmente é -, em matérias que possuem interesse público – pois, se a sociedade quer saber o nome de políticos investigados por corrupção, também deseja saber de magistrados alvos de tais investigações, pois são pagos com o nosso dinheiro -, aí, a justiça se mobiliza rapidamente. A liminar saiu “a jato”, mostrando a eficiência que o juiz da 10ª Vara Cível de Fortaleza talvez não demonstre noutros autos.
Relembro Eros Grau – este, sim, um magistrado autêntico e honesto -, que, quando ministro do Supremo Tribunal Federal, denunciou que a pior ditadura não é a das fardas, mas a das togas.
O que fazer diante da crescente e seletiva ditadura das togas?
Será preciso apelar para Francisco?
O papa deverá rogar a proteção de Cristo, das Chagas?
Ou simplesmente devemos relaxar diante disso e ler, por exemplo, escritos de Lima Barreto?
Ou de Castro Alves?
*Paulinho Oliveira,
Jornalista e servidor do Tribunal de Justiça do Ceará.