Da Coluna Segurança Pública, no O POVO desta segunda-feira (10), pelo jornalista, sociólogo e doutorando em Sociologia (UFC) Ricardo Moura:
Não há como avaliar o valor da vida humana do ponto de vista financeiro. Cada perda tem um impacto particular que não pode ser submetido a uma métrica. O que se pode estimar é o quanto de força de trabalho e de potencial geração de riqueza as nações perdem por causa das mortes violentas. Diversos estudos vêm sendo realizados no sentido de avaliar os impactos da violência nas economias dos países. Instituições como o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco Mundial estão se debruçando sobre o assunto na tentativa de compreender o problema e auxiliar na busca por soluções.
Tais organizações possuem capilaridade e capacidade de mobilizar pesquisadores e recursos. É bastante sabido que informações precisas e atualizadas, bem como avaliações das políticas públicas são componentes estratégicos nas ações bem-sucedidas de redução da criminalidade e da violência. Os diversos dados publicados a seguir são resultado desse esforço em traçar um panorama amplo da criminalidade e da violência no continente americano.
Pesquisa realizada a partir dos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) mostra que, em busca de segurança, paga-se mais pelo valor dos imóveis nas regiões metropolitanas. O incremento chega a R$ 1.513 por imóvel ou R$ 27 bilhões, se considerarmos todo o universo da amostragem. O paradoxo é que tais residências estão localizadas justamente nas áreas em que há maior incidência de roubos e furtos.
Além disso, o medo de ser a próxima vítima da violência faz com que os cidadãos restrinjam seus horários, limitem sua circulação pela cidade e deixem de praticar determinadas atividades. Tudo isso gera algum tipo de repercussão econômica. Se por um lado as empresas de segurança privada passam a ganhar mais com essa sensação disseminada de insegurança, por outro, setores inteiros veem cair sua competitividade. Exemplos de áreas que poderiam ser exploradas do ponto de vista turístico e não o são por causa da violência não faltam em Fortaleza. Isso sem falar dos serviços 24 horas que cada vez mais ficam mais restritos.
Há ainda custos econômicos indiretos e muito difíceis de serem mensurados, como a deterioração da confiança pública no sistema judicial. Segundo Nathalie Alvarado, coordenadora de Segurança Cidadã e Justiça do BID, estudos de caso realizados pelo banco no Uruguai, Chile e Costa Rica estimam que os homicídios implicam um custo total de aproximadamente entre 2,5% e 3,5% por cento do Produto Interno Bruto nestes países. No Paraguai e em Honduras, os danos ultrapassam 8% do PIB. Se o medo pode causar danos à saúde financeira, um levantamento feito na América Central revela que uma redução de 10% nos níveis de violência dos países pesquisados teria repercussão de cerca de 1% a mais no crescimento anual per capita.
Os cálculos acerca do PIB levam em consideração a falta que determinada mão de obra poderia fazer na geração de riqueza de uma nação. Como as vítimas preferenciais da violência são os jovens pobres do sexo masculino, é de se pensar que estamos comprometendo um dos nossos principais motores econômicos. Não fazer algo, do ponto de vista da ação governamental, já é fazer algo. Quando vemos a distância que há entre o esforço de se investigar a morte de um empresário ou de um pastor em comparação com a de jovens e adolescentes das periferias, é possível supor que haja algum tipo de distinção entre tais existências, sejam elas morais, sociais ou econômicas.
Tal processo de classificação remete ao conceito de “vidas descartáveis”, ou seja, de pessoas que por um motivo ou outro não conseguem ser absorvidas pelo mercado e se veem eliminadas de forma impune. É chocante ter de pensar que essa situação esteja ocorrendo, mas as estatísticas estão aí e o diminuto grau de resolução de casos envolvendo jovens e adolescentes pobres ou em conflito com a lei mais confirmam que negam essa hipótese. Para que isso mude, é preciso que o Estado e a própria sociedade passem a encarar seus jovens como portadores do potencial de empreendedorismo e de inovação. É preciso que vejamos nossas próximas gerações como uma riqueza e não apenas como uma imensa bomba-relógio prestes a explodir.