Com o título “A arte da guerra e o Velho do Restelo”, eis artigo do jornalista e professor Francisco Bezerra (Bezerrinha). Ele aborda o comportamento da “velha mídia”que apregoou o desastre que seria a Copa do Mundo. Agora, essa mesma velha mídia prefere destacar que o sucesso da festa deve-se apenas aos brasileiros. Confira:
“Uma mentira dá uma volta inteira ao mundo antes mesmo de a verdade ter oportunidade de se vestir.” Winston Churchill, primeiro-ministro britânico.
“Se você conhece o inimigo e conhece a si mesmo, não precisa temer o resultado de cem batalhas. Se você se conhece, mas não conhece o inimigo, para cada vitória ganha sofrerá também uma derrota. Se você não conhece nem o inimigo nem a si mesmo, perderá todas as batalhas.” O caro leitor, certamente, já deve ter ligo algo sobre Sun Tzu o general, estrategista e filósofo chinês, conhecido por sua obra A Arte da Guerra, composta por 13 capítulos de estratégias militares. O introito tem por desiderato contextualizar a guerra travada entre mídia conservadora e governo antes, durante e depois da Copa do Mundo. O governo conhece o inimigo, mas parece não conhecer a si mesmo. Desse modo, embora tenha vencido a guerra da Copa, na opinião pública, não há certeza do triunfo em mais um confronto beligerante que se avizinha.
Os assessores do Planalto não lerem o filósofo Chinês. Do contrário teriam se preparado melhor para o embate. O que diziam os arautos do fim do mundo antes do início da competição organizada pela FIFA: “A Copa será um fracasso”; “A organização da Copa fará vergonha ao Brasil”; “Aeroportos não irão funcionar bem”; “A mobilidade urbana será um caos”; “Os estádios estarão inacabados”; “As manifestações trarão violência e afugentarão turistas de outros países”; “Violência inviabilizará a Copa”; Vai ter Copa no Brasil?”. A ordem unida juntou na mesma trincheira, os de sempre: organizações Globo, Abril, Folha e Estadão. Estes em proeminência. Há ainda os satélites ou os que se conformam com migalhas do banquete publicitário nacional. As manchetes catastróficas eram estampadas em letras garrafais, editoriais, redes sociais e colunas de articulistas dia sim, dia não. Uma autêntica guerra eletrônica travada aos olhos ouvidos e computadores da nação. As redes sociais, divididas, reverberavam discurso do establishment ou contestavam a “Copa do Fim do Mundo”. Após estas considerações, cabe analisar os números finais da Copa. Observe a opinião de 2209 visitantes estrangeiros ouvidos pelo Instituto Datafolha:
– 92% dos visitantes elogiaram o conforto e a segurança;
– 76% aprovaram o transporte até os estádios;
– 95% disseram que a recepção foi boa ou ótima;
– 83% elogiaram a organização.
Embora reconhecendo que a Copa não foi um evento sem cefaleias, há outras boas notícias. Alvo de muitos fantasmas usados para atemorizar visitantes, o Rio de Janeiro recebeu 900.000 turistas contra 90.000 previstos. Eles deixaram 4 bilhões de reais na cidade, contra 1 bi de previsão. Impelidos a buscarem discurso para enfrentar uma situação inesperada, nossos profetas do apocalipse completaram um ano de campanha contra o evento, desde os protestos de junho de 2013, com sorrisos desconcertados.
Passada a fase da autocrítica, é preciso explicar o que aconteceu. Na falta de explicação melhor, a moda agora é dizer que o sucesso da Copa se deve aos “brasileiros.” Assim, no genérico. Os 200 milhões de brasileiros garantiram a Copa das Copas porque são simpáticos e acolhedores. Descobrimos essas virtudes agora? A finalidade desse discurso é fingir que não havia oposição à Copa, movimento que se expressou num esforço permanente para impedir os jogos e criar um ambiente de desordem, sufoco e desmoralização. Apelos ao boicote eram ouvidos nos melhores jantares, nas melhores famílias. Inclusive em inglês com legendas. A Copa era combatida com argumentos à direita. Em outros lugares, à esquerda. O importante é que não desse certo. Se desse certo, teria que ser capitalizada por setores que não os governamentais.
A mídia conservadora nos fez lembrar O Velho do Restelo, personagem criado por Luís de Camões no canto IV da sua obra Os Lusíadas. Tal personagem simboliza os
pessimistas, os conservadores e os reacionários que não acreditavam no sucesso da epopeia dos descobrimentos portugueses, e surge na largada da primeira expedição
para a Índia com avisos sobre a odisseia que estaria prestes a acontecer. Se as admoestações do Velho do Restelo tivessem sido ouvidas, o Brasil não teria sido
descoberto pelos navegadores portugueses.
A Copa ocorreu, apesar da campanha de terror orquestrada pelos senhores da Casa Grande. A competição foi sucesso de organização, entusiasmo e festa por esforço
da grande maioria da população, que não só queria assistir aos jogos como também participar de um evento que mobiliza todo o planeta. A mesma população que, prenhe de civismo, estava resoluta: defender imagem do país seria tarefa inadiável. Foram os adversários da Copa que transformaram o Mundial numa guerra política – e perderam.
A velha mídia, como partido de oposição, foi a expressão maior do revés. A derrota acachapante, no entanto, não fará arrefecer o ânimo de quem tem vocação atávica para a conspiração. Como predadores sem escrúpulo, as vistas vão se voltar agora para o processo eleitoral em curso, onde informação sobre queda de avião comercial é esquecida e bolinha de papel vira arma mortífera nas redações a soldo dos rentistas e apátridas de plantão. Vai começar, assim, mais uma guerra político-midiática. Para finalizar, outra frase reflexiva de Winston Churchill: “Se todas as batalhas dos homens se dessem apenas nos campos de futebol, quão belas seriam as guerras.”
* Francisco Bezerra,
Jornalista e professor.