Em artigo no O POVO deste sábado (23), o médico, antropólogo e professor universitário Antônio Mourão Cavalcante comenta do consumismo no Natal. Confira:
A cidade começa a ficar mais iluminada. Estas luzes anunciam o Natal. Então a festa se inicia.
E o comércio se agita. É hora de consumir. Nas empresas e repartições públicas, os mesmos de sempre engajam-se na organização de “nossa festa de Natal!” Haverá a leitura de uma mensagem – natalina, naftalina – e depois, a troca de presentes, nominada eufemisticamente de “amigo secreto”.
Confesso que as luzes multicores me animam. As praças ficam mais alegres. As pessoas se inauguram em outro clima. É Natal!
No começo, diríamos que o propósito é proclamar a vinda de Jesus, o filho de Deus feito homem. Alegria… Mas a outra “religião” – segundo Walter Benjamin – gradativamente tomou conta da festa, tornando-se um grande festival de consumo. Por isso, tantas luzes brilhantes em torno dos “templos” dessa nova e ousada religião. A oferta do paraíso agora, com o seu cartão de crédito, em módicas prestações mensais.
Dentro do templo, que pode ser – por exemplo – um shopping, ícones piscando, oferecendo novas fontes de prazer: o iPod, iPad, laptop, celulares espertos, cine – televisões gigantes, perfumes importados, sapatos esportes, calças jeans, enfim… tudo a seus pés e gosto. Ninguém saberia superar estas tão extraordinárias ofertas de prazer e felicidade. “O capitalismo acaba com o que é encantamento, dissolvendo tudo em prol da mercadoria, do dinheiro, do mercado, das coisas prosaicas”, diz Michel Löwy.
Daí, aprecio tudo isso com um misto de aflição e melancolia. Como cordeiros adestrados, seguimos naquela fila do consumo sem fim e sem nexo, para onde?
No dia 25 de dezembro, pela manhã, depois da festa concluída, com um misto de arrependimento e ressaca… resta esperar, nas grandes lojas, o gigantesco queima de Natal. Elas ainda precisam sugar as últimas gotas de sangue dos fiéis (consumidores) da nova ordem…
Confesso que, conhecendo o percurso desse período, as luzes piscando, a música sendo sinos tocando, me invade uma nostalgia. Saudades do tempo em que íamos ver a lapinha na Igreja e depois assistir à Missa do Galo. Tudo muito simples. Comer o bolo com suco, tudo feito em casa e, dormir de barriga cheia, esperando que Papai Noel deixasse um presente bem legal.