Em artigo enviado ao Blog, o estrategista e consultor de Marketing Corporativo, Fabner Utida, avalia a papel da sociedade na segurança pública. Confira:
Como tantas pessoas, eu também acredito que a violência e a insegurança chegaram a patamares muito além do absurdo aqui em nossa amada Fortaleza. No entanto, não acredito ser razoável a exagerada crítica à gestão da Segurança Pública do Ceará, especialmente em relação ao Programa Ronda do Quarteirão.
Ano passado, um amigo teve o carro roubado, dias depois a polícia localizou seu “suado” bem. Mês passado, minha cunhada e minha sogra chegavam para visitar minha esposa, quando foram assaltadas por três elementos armados com revólveres, assim que estacionaram o carro em frente ao prédio. Cerca de 10 minutos depois, chegou a viatura do Ronda do Quarteirão. Os policiais foram educados e prestativos. Se dirigiram para uma favela que fica a dois quarteirões do prédio, entraram na tentativa de localizar os marginais, mas, infelizmente, o formato do local oferece uma vantagem competitiva para a fuga. Os policiais não esconderam a frustração de não terem ido além do que fizeram. Neste momento, percebi (na “pele”) o quão complexa é esta questão da violência.
Não sou propriamente um especialista no assunto, isto posto, deixo claro que estas palavras representam a minha percepção sobre esta questão da insegurança que estamos vivendo em nossa linda capital cearense.
A crise não é da gestão da segurança pública cearense, a crise é da nossa sociedade. A crise é sistêmica, e como toda crise sistêmica, diversos fatores atuam juntos ou em separado e acabam contribuindo para um mesmo triste resultado final.
Tal qual a violência, o consumo de drogas aparenta viver o pior momento da história da nossa sociedade. Nunca se viu tanto consumo como agora. E não são apenas os desafortunados que estão contribuindo para a violência. Não raros, carros importados param próximos às “bocadas”.
De onde vêm as drogas? Como são produzidas? Como chegam aqui? Quem são os traficantes? O que a família e os amigos estão fazendo quando descobrem que um ente ou amigo está entrando neste sombrio mundo das drogas? O que a polícia cearense tem feito para o combate?
Infelizmente, também parece que a corrupção tem chegado cada vez mais a ambientes jamais pensados. Temos acompanhado na imprensa casos de bandidos que são presos, que já haviam sido presos recentemente, que antes também tiveram presos, depois de novamente presos. O pior é que em breve estarão em liberdade.
O consumismo demonstra ter atingido patamares que, de repente, parece que vale tudo para TER. De repente o SER ficou “fora de moda”. Há pouco mais de três anos, uma quadrilha de jovens de classe média foi capturada pela polícia aplicando golpes na internet. E qual era mesmo motivo dos crimes? Ah sim, financiar as baladas e a compra de produtos de grife e luxo. Um dia destes, a polícia prendeu uma quadrilha especializada em roubos de notebooks em veículos: todos jovens de classe média alta. E tem também aquele “esperto” que compra um Rolex roubado porque é “uma grande oportunidade”.
Antigamente quando uma criança chegava em casa com um objeto que não era dela, a regra era clara: tem que devolver. Quando um filho ou filha mentia ou faltava com o respeito em casa, a imposição de limites era certa. A educação de valores era uma responsabilidade da família como um todo. A escola era um ambiente para alfabetizar e oferecer conteúdo, mas também para disciplinar (professores com medo de alunos era algo impensável no passado). Um marginal não encontrava respeito e admiração na sua comunidade como, por tantas vezes, acontece hoje. Quando um menor é estimulado a entrar para o mundo do crime, de quem é a responsabilidade afinal? Do poder público? Dos maiores que o colocaram no mundo do crime? Dos pais que podem ter feito vista grossa? Da legislação que é “amena com os menores criminosos”? Se a crise também é de valores, então somos todos (escola, família, comunidade e Estado) corresponsáveis.
Ao governador Cid Gomes, o meu respeito por ousar enfrentar esta questão de frente ou, ao menos, tentar algo novo. É claro que a segurança pública cearense tem muito a evoluir, e sempre terá. Mas só comete erros quem aceita o desafio de fazer algo. Só não erram aqueles que não realizam nada. Na verdade não acho que os maiores erros sejam estritamente do Ronda, até porque se tivesse algum erro do Governador seria mais de comunicação e mobilização da sociedade do que outra coisa.
Cada um de nós pode contribuir de alguma forma. Está na hora de relembrar John Kennedy: “Não pergunte o que o seu país pode fazer por você, mas o que você pode fazer pelo seu país”. Que façamos como Gandhi ensinou: sejamos nós mesmos a mudança que queremos ver no mundo.