Com o título “Pesquisas: da opinião pública à opinião publicada”, eis artigo do publicitário e poeta Ricardo Alcântara, que está de volta ao Blog com sua análises e avaliações polêmicas. Ele aborda as pesquisas eleitorais e seus errinhos que causam estragos. Confira:
Nenhuma atividade humana está imune ao logro. Pois institutos de pesquisa, em sua maioria, adulteram resultados, sim, quando regiamente pagos para este fim. Também é verdade que há institutos, inclusive entre os maiores, que definitivamente não operam nessa frequência.
Outra verdade sobre pesquisas de opinião: como os juízes de futebol, os institutos de pesquisa erram, na maioria dos casos em que isto ocorre, involuntariamente, levados mais habitualmente pelas limitações técnicas do método do que pela presumida má fé que sempre lhe conferem.
Mais uma verdade: assim como os garçons alegam boa fé, mas sempre erram as contas “para mais”, as pesquisas tendem mesmo a captar com menor precisão os percentuais de quem se encontra em ascensão e, ao contrário, com maior definição os índices dos líderes mais previsíveis.
Outra: como em quase todas as circunstâncias de relacionamento humano, há uma margem variável de insinceridade também quando um pesquisador aborda o cidadão comum. Neste caso, agravada porque o contato se dá entre desconhecidos e sob a pressão de expectativas relativas ao saber.
A abordagem das pesquisas de opinião é precária por si: dela deve resultar uma resposta estritamente objetiva para uma questão tão subjetiva quanto possa ser a intenção de voto, que se dá sob a influência de estímulos sobre as quais o próprio sujeito do voto tem precária consciência.
É comum que este se sinta bem menos à vontade para manifestar suas inclinações quando elas incidem sobre nomes ainda emergentes na curva média das preferências, optando muitas vezes por declarar na ocasião outro nome, que lhe pareça mais razoável ao senso comum momentâneo.
Nada do que está dito aqui é pronunciado à margem da experiência e do conhecimento. Para cada uma dessas afirmações, fácil demais seria citar inúmeros exemplos. Há farta literatura sobre o assunto e, nela, consensos suficientes para que as pesquisas sejam observadas com maior reserva.
Logo, não há nada de novo sob o sol do Ceará. Já nas primeiras eleições municipais realizadas por aqui, em 1985, a professora Maria Luiza Fontenele assombrou a cidade com a “explosão silenciosa” de sua vitória – algo que provavelmente nem mesmo ela talvez acreditasse até a véspera.
O problema resulta de um equívoco original: a credibilidade excessiva que se atribui aos percentuais apresentados pelas pesquisas eleitorais, onde o erro maior é tomar o fator “margem de erro” como uma mera reserva técnica, quando, na verdade, há nele uma larga plausibilidade.
Os meios de comunicação dão força de verdade às pesquisas em suas manchetes e as execram nas “análises de fundo”. Os políticos, igualmente: reclamam dos resultados quando não lhes agradam, mas os divulgam com estardalhaço nos seus programas eleitorais quando os números lhe favorecem.
Boa parte da imprecisão das pesquisas decorre ainda da natureza volúvel do eleitor, em sua maioria despolitizado, e, ainda, já que as certezas confortam, a necessidade emocional do militante em crer, sob a tensão extremada da disputa, que ele reagirá movido por parâmetros previsíveis. Nem sempre.
Em Fortaleza, compreendida as reações de humana decepção, não é sensato afirmar que os grandes institutos se uniram em um grande conluio para prejudicar Heitor Férrer. Mas é plausível admitir que ele deva pelo menos em parte sua exclusão do segundo turno a esta distorção projetiva.
Se pudesse definir em uma única expressão o que aconteceu em Fortaleza, apostaria no acentuado grau de indiferença do eleitor diante do processo de disputa como o fator que mais contribuiu para que chegassem ao segundo turno aqueles candidatos com maior exposição na mídia.
Quanto menos o eleitor se envolve no processo eleitoral, maior a influência da propaganda e menor a força da opinião pública – porque opinião pública não é a opinião que se publica, mas o que as pessoas andam dizendo umas para as outras, uma dimensão mais autônoma da comunicação social.
Logo, diante de um quadro de apatia, impediu Heitor Férrer de seguir adiante a dificuldade em dotar a esperança que ele representou de uma atmosfera de maior entusiasmo e militância. E aí, mais do que ocupar-se com pesquisas, deveria ele refletir sobre as contradições políticas de sua candidatura.
* Ricardo Alcântara,
Poeta e Publicitário.