Com o título “Bolsonaro e a velha política”, eis artigo de Cleyton Monte, Cientista político, professor universitário e pesquisador do Lepem (Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia). “O governo assumiu há pouco, mas já carrega escândalos”, diz o texto. Confira:
Jair Bolsonaro foi eleito em 2018 com um forte discurso de defesa da moralidade. Prometeu combater energicamente a velha política e suas práticas. O ex-deputado entende por velha política tudo aquilo que foi produzido nos governos FHC, Lula e Dilma. Essa narrativa ganhou consistência e poder eleitoral a partir de incontáveis escândalos de corrupção, ativismo do Judiciário e mobilização dos mais diferentes tons da direita brasileira. Não é novidade o discurso ético como motor político. Jânio Quadros e Fernando Collor usaram essa bandeira com maestria. Ambos tropeçaram no populismo demagógico e esbarraram nas armadilhas da velha política.
Vivemos uma era de transição. Os grandes partidos e lideranças de peso sofreram derrotas importantes em 2018, mas não foi criado nada de substancial para ocupar esse lugar. A sociedade optou pela ultradireita. Isso não quer dizer que a velha política morreu. O governo afirma que não utilizou critérios partidários para nomear ministros. Entretanto, o presidente e seu grupo sabem que as regras institucionais não foram alteradas. Tanto é que articularam o apoio à reeleição de Rodrigo Maia (DEM) – um exemplo incontestável de político tradicional. A negociação com o Congresso Nacional será sustentada somente pelas bancadas parlamentares? O novo modelo irá sobreviver sem a mobilização dos líderes partidários e seus métodos?
O governo assumiu há pouco tempo, mas já carrega escândalos. Denúncias de desvio de recursos públicos, ligação com milícias e evolução irregular de patrimônio envolvem familiares e assessores próximos ao presidente – sem falar nas bizarrices de certos ministros. A agenda de promessas é extensa. A sociedade não suportará o discurso de campanha por muito tempo. O maior desafio: aprovar as medidas da chamada “nova era” e reduzir os impactos das denúncias, sem passar pelo famoso “toma lá, da cá”. Se Bolsonaro conseguir essa proeza, abrindo mão do autoritarismo, poderemos dizer que construímos uma novidade nos trópicos. Caso contrário, se repetir os vícios da velha política, colherá a insatisfação de sua base política. Os mais desiludidos lembrarão a frase de Dom Tancredi para o príncipe Fabrizio na obra “Leopardo”, do italiano Tomasi di Lampedusa: “se quisermos que tudo continue como está, é preciso que tudo mude”.
*Cleyton Monte
cleytonvmonte@gmail.com
Cientista político, professor universitário e pesquisador do Lepem (Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia).