
Eis artigo assinado pela jornalista Regina Ribeiro, no O POVO desta sexta-feira. O título, “Dez é demais”, aborda algo que concordamos: há candidato demais disputando a Prefeitura de Fortaleza. E gente atrapalhando, pois a discussão dos problemas graves de Fortaleza acaba indo para o escanteio até nos embates televisivos. Confira o artigo:
Motoristas de táxis são talvez alguns dos personagens mais interessantes de uma cidade. São verdadeiros editores de pedaços de histórias contadas entre os minutos que se arrastam no trânsito lento. Têm também um repertório pronto de temas e opiniões que eles distribuem com a máxima generosidade. Como não dirijo, apanho muito táxi. E, mesmo quando não estou para conversa, sinceramente é quase impossível não ouvir os monólogos taxinianos.
Em Recife, semana passada, peguei um táxi e enfrentei um engarrafamento terrível. Como estava atrasada, nem queria saber o que o motorista tinha pra dizer sobre o trânsito na capital, cada vez mais complicado e que ninguém fazia nada. Esse mantra eu já conheço, fui fazendo de conta que estava interessada, empurrando a conversa com qualquer monossílabo. Até que ele me disse que era um absurdo Recife ter cinco candidatos a prefeito. Aí, sim, a coisa ficou animada. Um absurdo por quê? Por que, para começar, só tem dois que interessam, os outros entram só para tumultuar a história. Depois, eles dizem praticamente a mesma coisa, são tão parecidos que confundem a gente.
Cinco candidatos é muito? Pois lá em Fortaleza temos dez candidatos. O homem quis se admirar, olhou pelo espelho interno, acho que para conferir algum sinal de brincadeira (ou de exagero feminino). Dez? Puxa! Silenciou.
Puxa digo eu. Vejo entre esses candidatos homens que estão há anos no cenário político, gente que, como diria o taxista, pensa quase a mesma coisa. Eu, simples eleitora, fico imaginando como faz falta um projeto imperativo para Fortaleza, capaz de reunir competências intelectuais e políticas, e como sobra gente dizendo que tem esse projeto. Na verdade, embora tenhamos dez candidatos mergulhados num sem-número de propostas e promessas, não vejo em nenhuma das candidaturas um projeto alentador para a cidade. Lembro-me, então, de Maisie, personagem de um romance de Henry James (Pelos olhos de Maisie). Na ficção, a disputa pela guarda da menina faz com que ela perceba que tem dois pais, duas mães, duas governantas, mas esteja no mais completo abandono. Parece que o excesso dá mesmo essa sensação de vazio, de incompletude.
Regina Ribeiro
reginah_ribeiro@yahoo.com.br
Editora das Edições Demócrito Rocha