
Marina Silva parecia tranquila e leve na sexta-feira (8), pela manhã, no seu primeiro dia fora do PV – e ainda sem nenhuma inclinação por qualquer sigla partidária no atual cenário político. Em entrevista ao Estado, quando indagada sobre o que achava do fato de a presidente Dilma Rousseff ter convidado o senador Blairo Maggi (PR-MT)para o Ministério dos Transportes ela riu e disse: “Ainda bem que não foi para o Meio Ambiente.”
Na época em era ministra do Meio Ambiente, no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ela andava às turras com o então governador Maggi, que também é empresário na área do agronegócio e a acusava de exagerar nas informações sobre o desmatamento.
Apesar do riso, Marina disse que torce pelo governo de Dilma. Deixou claro que, embora afastada do guarda-chuva partidário, nem pensa em se distanciará da política. Ela já se prepara para as eleições de 2012, quando deve subir no palanque de candidatos a prefeito identificados com as propostas de sustentabilidade defendidas pelo movimento suprapartidário que irá organizar a partir de agora. Por outro lado, não nega totalmente, a possibilidade de voltar a concorrer à Presidência em 2014.
No momento vai se dedicar a conversar com políticos de diferentes partidos sobre o que ela chama de “uma nova forma de fazer política”. Seu leque de interlocutores é amplo inclui deputados e senadores do PT, PDT e PSB. Também anda conversando com a ex-senadora Heloísa Helena (PSOL-AL), que concorreu à Presidência em 2006 e hoje é vereadora em Maceió.
Estadão – A senhora costuma dizer que é uma pessoa de processo, que leva tempo para se definir. Como foi o processo de saída do PV? Teve algum fato definidor, a chamada gota d’água?
Marina Silva – Eu acho que teve uma pororoca, como disse o Ricardo Young (empresário que concorreu a uma cadeira no Senado e se desfiliou do PV com Marina). Foi essa mobilização que a sociedade fez nas eleições e continua fazendo. Tem algo mudando. As pessoas procuram uma forma de envolvimento que é diferente do engajamento da minha geração. Eu compreendo isso como um legado para a democracia brasileira, para o aperfeiçoamento das instituições. Toda essa mobilização, esses quase 20 milhões que votaram em nossas propostas em 2010, deveria ser recebida como um legado, para ser metabolizado pela sociedade, pelos partidos, organizações de governo. Ficou claro que a demanda da sustentabilidade é uma demanda da sociedade brasileira.
Estadão – O PV foi um dos que não conseguiram absorver esse legado?
Marina – Lamentavelmente o PV ainda não se dispôs a metabolizar o que nós suscitamos na sociedade. Lamentavelmente, não foi possível permanecer, porque não vou ser incoerente com aquilo que faço e o que falo. Entrei no PV porque o partido estava disposto a passar por um processo de revisão programática e reestruturação. A ideia era transformá-lo num partido atualizado e capaz de dialogar com a sociedade. Me animei com essa propostas, com a expectativa de tirar do papel de mero espectador as pessoas que são militantes, simpatizantes do PV e de outros partidos, com o objetivo de dar-lhes o papel de protagonistas. Eu esperava que o PV pudesse fazer isso, mas ele não fez.
Estadão – Houve algum fato, algum momento no qual a senhora percebeu que as tentativas de negociação com a direção do partido não dariam em nada?
Marina – Nós ficamos cinco meses depois das eleições sem uma reunião da Executiva Nacional do PV. Quando ela se reuniu, aconteceu o que vocês já sabem (o mandato da atual direção foi prorrogado). O que fizemos foi apresentar uma proposta, singela, de transição democrática, que incluía a escolha dos diretórios, a limitação dos mandatos de cargos de direção para dois anos, campanhas de filiação, recadastramento de filiados e um congresso para mudar o estatuto. Ao final haveria eleição para escolha de novos dirigentes do partido, deixando para trás a tradição de nomeação de pessoas. Era uma forma de intentar internalizar o legado das eleições.
Estadão – Foi mais difícil sair do PV ou do PT?
Marina – Seria hipocrisia dizer que não foi mais difícil sair do PT, no qual estou desde a fundação, com trinta anos de relações com pessoas que me são muito caras. Mas também não foi fácil sair do PV. Em que pese ter ficado dois anos, a relação que tenho com algumas pessoas também é de pelo menos vinte anos. Conheci as pessoas do PV pelas mãos do Chico Mendes, que criou o PV do Acre.
Estadão – O que sente ao deixar o partido?
Marina – Tenho gratidão, porque graças à compreensão do PV tivemos uma eleição que não se resolveu de forma extemporânea no primeiro turno, percebemos que as pessoas podem participar da política independentemente das estruturas e das alianças e fazer da sua participação algo relevante. Foi bom ver o Brasil integrado aos movimentos que estão acontecendo no mundo. Para mim o que aconteceu na Espanha e no Egito e ainda acontece em vários lugares do mundo estava configurado aqui no processo das eleições. Houve uma mobilização da sociedade. O eleitor não se conformou com o papel de coadjuvante naquela eleição anunciada como um plebiscito entre o governo e a oposição.
Estadão – No ato público em que se desfiliou do PV, a senhora disse que pode apoiar as coisas boas do governo. No pronunciamento no encontro do Partido Verde da Alemanha, em Berlim, dias atrás, destacou boas iniciativas que estariam sendo adotadas no Brasil. A senhora tem alguma simpatia, algum diálogo com a presidente Dilma?
Marina – O que fiz agora na Alemanha não é diferente do que tenho feito em todos os momentos em que saí do Brasil na época em que era ministra do Meio Ambiente. Sei separar os interesses do meu País, das coisas mesquinhas da política do cotidiano. Sei fazer isso aqui dentro e lá fora. Claro que não é sem crítica. Eu falei das coisas boas que o Brasil tem feito e que são fruto da nosso trabalho, do empenho da sociedade brasileira. O Brasil tem conseguido reduzir o desmatamento e pode ser uma potência agrícola sem precisar destruir florestas. Quanto à Dilma, também é algo que pratico há anos, ao longo de toda minha vida. Quando o Fernando Henrique era presidente, nunca neguei apoio às coisas que considerava corretas. Na ocasião em que o Adib Jatene fez uma bela exposição no Congresso defendendo a CPMF, eu votei a favor, ao lado do senador Eduardo Suplicy (PT-SP), mesmo com a forte recomendação do partido para que não fizéssemos isso. Se foi assim com alguém com que eu nem tinha relação, imagina com a Dilma. Nós trabalhamos juntas durante cinco anos e ela é a primeira mulher presidente da República. Vou torcer para que dê certo. Vejo problemas, tenho preocupações com tudo que está acontecendo, como a perda de dois ministros no início do governo, essas denúncias gravíssimas que estão aí. E se ela resistir, é claro que temos de resistir com ela. Eu não aposto no quanto pior melhor.
Estadão – Se fosse convidada por Dilma para algum ministério, aceitaria?
Marina – Eu já dei a minha contribuição. Hoje contribuo mais da forma como estou fazendo. Quero ajudar na criação de uma nova cultura política, um novo consenso político. Eu acho que a sociedade brasileira está fazendo um esforço para sair do atual quadro político. Não devemos duvidar da possibilidade de toda essa situação caótica abrir espaços para grandes mobilizações. Eu acho que seria um sol na nossa realidade, criaria as bases para que o presidente possa ter mais oxigênio para fazer uma gestão voltada para os interesses do País e não ter que ficar voltado para a agenda miúda dos cargos, a agenda miúda dos interesses pequenos.
Estadão – Podemos esperar a senhora participando do pleito presidencial de 2014?
Marina – Quando digo que não sei é porque não sei mesmo. No momento estou avaliando como posso contribuir mais. É uma discussão que estou fazendo. É na interação com a sociedade.
(Agência Estado)