Com o título “Para que criminalizar as greves?”, eis artigodo sindicalista Pàulinho Oliveira, do Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Ceará. Ele quer se contrapor ao artigo aqui veiculado – “Um martelo contra os abusos” – e de autoria do promotor de justiça Walter Filho. Confira:
Causou-me espanto, para não dizer repúdio, o artigo intitulado “Um martelo contra os abusos”, de autoria do promotor de justiça Walter Filho, titular da 9ª Promotoria de Justiça da Fazenda Pública de Fortaleza. Em seu libelo repleto de achismos e preconceitos, o articulista vocifera contra os sindicatos, afirmando ser “uma excrescência” haver mais de 15 mil entidades representativas de direitos de trabalhadores brasileiros, dizendo, inclusive, serem tais sindicatos de fachada e palco de “abuso do dinheiro alheio”.
Infelizmente, o promotor de justiça que assina o artigo ora rebatido tem se notabilizado por publicar opiniões carregadas de ódio à esquerda e à luta da classe trabalhadora, não titubeando, inclusive, em aplaudir irregularidades praticadas no âmbito da Operação Lava-Jato, como os grampos vazados em março deste ano (vide o seu artigo intitulado “Moro e o sigilo”, publicado em 21 de março de 2016). Muito cômodo para o ilustre representante do Ministério Público Walter Filho se voltar contra as greves, já que não é o gordo vencimento que ele recebe – rendimentos brutos que ultrapassam a casa dos 34 mil reais, incluindo auxílio-moradia de mais de 5 mil reais, conforme Portal da Transparência do Ministério Público do Estado do Ceará – motivo para se queixar da vida ou das intempéries econômicas.
Ao contrário, servidores públicos como este jornalista, que trabalha há 21 anos no Poder Judiciário do Estado do Ceará, vê, dia a dia, políticas econômicas malfadadas e ajustes fiscais cruéis diminuírem, pouco a pouco, seu poder de compra. Além disso, as condições de trabalho são, cotidianamente, objeto de reclamação, como, por exemplo, a questão do assédio moral, representado pelo desvio de função e pela pressão exercida por seus chefes imediatos, em busca do atingimento de metas absurdas de produtividade.
Temos um sindicato – o SindJustiça Ceará, Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Estado do Ceará – que se converte em instrumento legítimo de reivindicação por parte dos servidores da Justiça, graças aos quais, aliás, o próprio promotor de justiça Walter Filho pode desenvolver melhor seu trabalho como representante do Ministério Público. Sendo assim, não é correto de sua parte criminalizar a luta sindical, mesmo porque só através dela os servidores conseguem – a duras penas, diga-se – vitórias como a redução da jornada de trabalho para 7 (sete) horas diárias, sem redução de vencimentos, em nome de uma melhor qualidade de vida. Tal conquista veio através de uma GREVE, que durou apenas 4 (quatro) dias pela disposição do Tribunal de Justiça em negociar, mas que duraria mais caso houvesse resistência injustificada às propostas de negociação.
Assim como o sindicato ao qual sou filiado, milhares de outros sindicatos no país inteiro, representantes das mais diversas categorias profissionais, cumprem o seu mister de ser a voz do trabalhador nas negociações com o patronato. Desta forma, quando o promotor de justiça Walter Filho afirma que “é preciso dar um fim aos profissionais da greve”, mencionando bloqueio de vias e ofensa ao alegado “direito de ir e vir”, contribui para jogar mais lenha na fogueira e incutir no leitor a ideia de que o sindicalista não passa de um criminoso que atrapalha a vida das pessoas, o que está longe de ser a verdade. Deveria Walter Filho, como promotor de justiça que é, guardar sintonia entre o que opina e a Constituição Federal, que garante o direito de greve aos trabalhadores urbanos e rurais, nos termos do artigo 9º da Carta Maior, vedados, obviamente, os abusos que sujeitam os responsáveis aos termos da lei.
Ao aplaudir a condenável decisão do Supremo Tribunal Federal que determinou o corte de ponto em servidores públicos grevistas – pelo placar de 6 a 5, diga-se -, o promotor Walter Filho apenas aproveitou para, em mais um artigo preconceituoso, vociferar contra a classe trabalhadora – da qual, aliás, ele não faz parte, pois, repita-se, é membro de uma elite privilegiada, que recebe gordos vencimentos, inclusive um condenável auxílio-moradia que não deveria receber, ainda que seja legal, por ser imoral. A greve é o mais eficaz instrumento de luta da classe trabalhadora contra a exploração, a humilhação e o arbítrio, e não serão achismos e preconceitos daqueles que articulam em sentido contrário que farão a população esclarecida olhar os servidores públicos que se mobilizarem em movimentos paredistas serem classificados como criminosos.
O preconceito embutido na opinião do promotor Walter Filho chega às raias do absurdo, ao expor o achismo de que “muitas vezes” os grevistas “invadem repartições com depredações e roubos”. Não cita um fato que comprove tal tese, e eu, grevista que fui e serei, sempre que necessário, posso afirmar que nem eu, tampouco meus colegas cometemos jamais qualquer ato de vandalismo. Afirmo, ademais, que atos vândalos não são a regra em movimentos grevistas, ao contrário do que quer fazer crer o ínclito promotor.
Falta com a verdade ainda o articulista em questão ao afirmar que “as greves bancárias perderam força”, devido à existência das maquinetas de auto-atendimento. Mais um achismo preconceituoso que não encontra guarida na realidade, uma vez que o movimento grevista recente dos bancários, mobilização histórica, conseguiu significativa melhoria em seus salários. Embora não tivessem atingido o objetivo inicial, é fato que a greve forçou os banqueiros a rever sua política de pagamento salarial aos seus funcionários. E sempre forçará, uma vez que os bancos seguem tendo lucros trilionários, enquanto os bancários sofrem com estafantes jornadas de trabalho e pressão para o atingimento de metas absurdas.
Sugiro ao senhor promotor de justiça Walter Filho – o qual, como todo brasileiro, tem o direito de opinar da forma que quiser – que se ponha no lugar de um trabalhador comum: seja da construção civil, dos bancos, do transporte coletivo, ou mesmo do servidor público ordinário, não investido de autoridade. Colocar-se no lugar do outro evitaria a proliferação de opiniões meramente preconceituosas, que em nada enriquecem o debate, antes fomentam a discórdia e contribuem para a propagação de inverdades.
Viva a luta da classe trabalhadora! Pelo direito de greve conforme garante a Constituição!
*Paulinho Oliveira,
Jornalista e servidor do Poder Judiciário do Estado do Ceará