Do jornalista Fábio campos, no O POVO desta quinta-feira, uma análise sobre a reaproximação política entre os EUA e Cuba.
Poucas decisões de Estado foram dotadas de tanta falta de inteligência quanto o bloqueio econômico dos EUA a Cuba. Um bloqueio do tipo prejudica sempre o conjunto da população (menos a cúpula) e acaba por reforçar e justificar as ânsias autoritárias de quem está no controle do poder. Em resumo, o bloqueio ajudou a manter Cuba fechada e garantiu a impressionante perenidade dos irmãos Castro no poder. Lá se vão mais de 50 anos.
O bloqueio continua, mas foi anunciada ontem a política de “détente” entre os dois países. É um fato de valor histórico. Já houve troca de prisioneiros. Foi só o começo. Os protocolos que regem a aproximação projetam autorização para uso de cartões de crédito e débito americanos em Cuba, a ampliação das autorizações de viagens de residentes nos EUA à ilha, a ampliação de US$ 500 para US$ 2.000 no valor de remessas trimestrais à ilha e o aumento no valor de exportações e importações entre os dois países.
Outro ponto muito importante: Cuba concedeu sinal verde para que empresas de telecomunicações americanas, incluindo as de internet, operem no País. Creiam, apenas esse conjunto de medidas já proporcionará forte impacto econômico a favor de Cuba. O fato é que a tendência é, cedo ou tarde, o Congresso dos Estados Unidos aprovar o fim desse lamentável bloqueio econômico. Sim, como é peculiar às democracias, o fim do bloqueio precisa passar pelo Parlamento.
Mas os efeitos em Cuba não vão se restringir às melhorias econômicas em um País que ficou em situação muito difícil após o esfacelamento da União Soviética, cujo regime bancava a ilha. As aberturas econômicas acabam por provocar efeitos na política. Uma abertura acaba levando à outra. Que assim seja.
Que maravilha seria ver a ilha se tornar uma democracia representativa, com parlamento, liberdade de organização partidária, eleições livres, liberdade de imprensa e direito à propriedade individual. Tudo aquilo que a democracia ocidental aprendeu a chamar “Estado de Direito”.
Sempre que me perguntam a respeito de Cuba, minha resposta é a mesma: “Tenho dificuldade de aceitar e apoiar um país onde não poderia exercer a profissão de jornalista, de analista político, com as plenas liberdades que a democracia o Brasil nos deu”. Simples assim. Há um bom número de jornalistas presos em Cuba por tentarem exercer a crítica. Presos pelo “delito” da opinião.
Cuba ainda mantém presos políticos. Estima-se que haja hoje em torno de 100 presos políticos no país. Tem diminuído, é verdade. Quando Fidel Castro se aposentou, eram cerca de 300. Caiu a quantidade e mudou o método. Com Raul, Cuba adotou as prisões rápidas para reprimir dissidentes. Com as temporadas curtas na prisão, o regime desarticula os movimentos pró-liberdade.
A abertura econômica tende a criar mais dificuldades para a repressão. Quanto mais Cuba se integrar à economia internacional, mas difícil será manter o regime fechado. As trocas comerciais impõem liberdade de ir e vir. Que o bloqueio se vá, quem sabe ajuda a levar com ela a ditadura.