Da Coluna Política desta terça-feira, assinada no O POVO pelo jornalista Érico Firmo:
As instituições públicas no Brasil se esmeram em manter a péssima reputação que têm, como regra. Membros do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos tribunais de contas são responsáveis por fiscalizar o trabalho de outros agentes públicos, coibir abusos e falcatruas, enfim, por zelar pelo interesse coletivo. Para cumprir essas e muitas outras tarefas, estão entre os maiores salários pagos pelo Estado brasileiro. Numa sociedade de tantos contrastes, no qual a atuação governamental deixa muito a desejar em todas as áreas cruciais, a recente concessão de auxílio moradia a essa elite do funcionalismo é privilégio asqueroso, desrespeitoso. Ainda mais quando a iniciativa parte do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), criado para ser o controle social da magistratura. Espalhada pelas mais altas castas dos setores que mais devem zelar pela probidade, essa acintosa benesse chega ao Tribunal de Contas do Estado (TCE). Deputados federais e senadores já desfrutam há muito da mesma distinção.
O debate sobre essa regalia precisa estar circunscrito ao contexto social e político. Diante da monumental tarefa que cumpre ainda aos agentes públicos, o tanto por fazer, não é admissível que um apanágio desses seja concedido à alta cúpula do poder institucional. São mais de seis salários mínimos para financiar a moradia das pessoas mais bem pagas pelo governo. É desrespeitoso com a sociedade. É descarado.
As instituições já são achincalhadas e seus membros – salvo exceções honrosas – parecem não ter pudores, ter zelo por elas. Nem ao menos a vaidade de preservar a autoimagem. Agem assim porque podem. São eles próprios que deliberam sobre o benefício do qual desfrutam, em nítido favorecimento em causa própria. O que se há de fazer? Recorrer à Justiça? Denunciar ao Ministério Público? Cobrar ação do tribunal de contas? Como diria Chico Buarque, só resta chamar o ladrão.
Muitos acham isso bobagem, pequeneza, polêmica por coisa miúda. Seria se a base da população tivesse moradia garantida, se houvesse margem para aumentar impunemente a despesa corrente do governo. Se o dinheiro governamental estivesse sobrando.
Simultaneamente, tramita no Congresso Nacional o aumento de salário do Judiciário, que já recebe as maiores remunerações do serviço público nas respectivas esferas. O reajuste passará fácil. E provocará outro efeito cascata, incluindo tribunais de contas.