Com o título “Sem margem para erro”, eis o artigo de Demétrio Andrade, jornalista e sociólogo. Ele aborda e faz a defesa das pesquisas, mas observa: o problema não são as pesquisas, mas a forma como são interpretada e divulgadas. Confira:
Não espere ler um artigo atacando os institutos de pesquisa, por conta dos diversos erros cometidos por eles neste 1º turno. Pelo contrário. Podem me chamar de inocente, mas eu acredito em pesquisas de opinião. Trabalho com elas desde os 19 anos. Já fui pesquisador de campo, checador e analista de instrumentos qualitativos e quantitativos. O problema não são os resultados aferidos, mas a forma como elas são interpretadas, divulgadas e como fazem uso dos números.
Pesquisas são importantes para qualquer atividade que se faça nos dias de hoje. O mercado exige precisão na tomada de decisões. Na política, não poderia ser diferente. Qualquer estrategista ou marqueteiro meia boca sabe que não pode prescindir delas. Ao mesmo tempo, porém, deve-se saber ponderar seus resultados a partir da conjuntura. Os institutos, por sua vez, dependem de credibilidade para sobreviver. As acusações de alterações de resultados são difíceis de se aceitar no limite do razoável, por conta desta necessidade.
Pesquisas são resultados de momento. Numa sociedade onde decisões são tomadas na velocidade da luz, onde se exige que façamos vinte coisas ao mesmo tempo, a tendência comum é fazermos leituras apressadas. A pesquisa eleitoral é uma fotografia, um corte espacial reduzido de um processo em movimento. A boa leitura só é possível se conseguirmos examinar o contexto no qual ela foi realizada. As causas e os efeitos dos números só podem ser corretamente mensuradas com uma análise minuciosa da conjuntura. Caso contrário, os números falarão por si mesmos e, para o desenho da melhor estratégia, isso fica longe de um cenário ideal.
Fica evidente que o sistema político brasileiro precisa de aperfeiçoamento. E que, cada vez mais, fatores externos à política estão influenciando os eleitores. Os excessos do uso do poder econômico são evidentes e fazem diferença. Votos, candidaturas e campanhas têm preço – por sinal cada vez maiores. Essa interferência financeira pode estar ditando mudanças ocorridas no dia da votação e não captadas pelos institutos.
A boca da urna – inclusive com um esquema profissional de compra de votos –, por exemplo, pode alterar o voto de quem não tem convicção em suas decisões ou que acha que pode tirar proveito imediato da sua condição de eleitor trocando seu sufrágio por dinheiro. Talvez, as pessoas que votam estimuladas pela compensação econômica sequer lembrem em quem votaram. Talvez tenham vergonha de admitir tal relação e acabam por reproduzir o “esquecimento” aos pesquisadores.
Outra explicação pertinente é o nível da abstenção – cada vez mais significativo – registrado nos últimos pleitos, sempre superando a casa dos 20%. É provável que muitos eleitores que votariam num determinado candidato sequer tenham ido à urna, ou por não terem condições de deslocamento ou por pura falta de interesse e motivação. Isso também irá causar distorções no resultado final do levantamento.
A imprensa, por sua vez, escolhe os dados que vai divulgar – ou que vai priorizar quando da veiculação. Desta forma, pode acontecer de um elemento – índice de rejeição de um candidato, diferenças entre votos válidos, percentuais do viés espontâneo, dentre outros – considerado secundário pelos editores possa já constar da pesquisa e não ser aproveitado na matéria, ou aparecer sem destaque.
O fato é que o eleitor brasileiro parece estar gostando de contradizer institutos e causar surpresas na reta final. A mim me parece, pequisas à parte, que tal dinâmica é fruto de um contexto onde eleitores tomam decisões de última hora, sendo refratários à discussão ideológica ou mesmo não suficientemente esclarecidos da importância da política, ou pelo menos da eleição, já que aquela escolha pode mudar – e muito – seu destino pelos próximos anos. Não adianta colocar a culpa nas pesquisas. Afinal, quem cometerá ou não o erro é o próprio eleitor.
* Demétrio Andrade,
Jornalista e sociólogo.