Com o título “Em nome dos filhos”, eis artigo de Henrique Araújo, jornalista do O POVO. Ele aborda denúncias de candidaturas “laranjas”, Carlos Bolsonaro e Gustavo Bebianno. Ou seja, mais uma confusão neste começo de nova gestão federal. Confira:
Mais que uma rusga trivial entre auxiliares do presidente, a crise que começou com candidaturas de “laranjas”, e se agravou com a briga virtual entre Carlos Bolsonaro e um ministro de Estado, preocupa não pelas consequências imediatas, mas pelo que sinaliza de turbulência.
Por uma razão: Bolsonaro, o pai, foi inábil para lidar com um problema cuja dimensão parecia menor. Afinal, não era difícil, àquela altura, isolar os estragos levantados pelas denúncias apresentadas pela imprensa, limitando o seu alcance ao partido, o PSL.
O que fez o presidente? Não só evitou conversar com Gustavo Bebianno, um dos seus homens de confiança, como subscreveu as críticas do filho ao seu auxiliar, desmentido em praça virtual e, agora, desmoralizado. Ora, ou um ministro é confiável ou é mentiroso, e nisso até Bolsonaro há de concordar.
Novamente, o presidente confundiu-se – ou foi confundido. Afinal, se endossara a acusação segundo a qual Bebianno, então alvo de acusações sérias, havia mentido, só lhe restava demiti-lo – houve quem achasse que o militar faria isso em rede nacional, durante a entrevista para a Record. Não chegou a tanto.
Mas Bebianno é hoje um “morto-vivo” na Esplanada, não se sabe se mais morto que vivo, já que o ministro resolveu sair das cordas e contra-atacar, fazendo chegar a Bolsonaro que o pesselista não será presidente por todo o tempo, numa alusão ao alerta que o próprio presidente tinha feito um dia antes, de que Bebianno poderia voltar às origens. “Todos voltamos às nossas origens”, respondeu o ministro.
Agora, o chefe do Planalto tem de lidar não apenas com um problema (o “laranjal” do PSL, de tamanho e impacto imprevisíveis, ao qual se soma o fantasma ainda não exorcizado de Fabrício Queiroz), mas inúmeros. Como efeito cascata, as interferências de Carlos levaram a bancada do partido na Câmara a apoiar Bebianno, malquisto por alguns setores, dentro e fora da legenda. O receio dos deputados é de que possam se tornar os próximos a ter a cabeça a prêmio oferecida pela família.
Além disso, os militares, que respondem pela cota de bom-senso no governo, assumiram um lado ao atuarem para garantir que o secretário-geral da Presidência não fosse defenestrado.
Moral da história: em vez de ajudar um ainda convalescente presidente num momento delicado para o Governo, as intromissões de Carlos só pioraram o clima político, o que pode comprometer até a aprovação da reforma da Previdência.
Um agravante: o timing para a demissão do ministro passou, e Bolsonaro perdeu a chance de delimitar a crise. A esta altura, parafraseando Bebianno, o ex-deputado já se respingou com suco de laranja.
E um terceiro fator: a imagem do presidente sai chamuscada do episódio, que, além de potencialmente desgastante, também se mostrou constrangedor, sobretudo por causa dos lances novelescos, como a divulgação de áudio do presidente da República nas redes sociais.
Já se sabia que Bolsonaro tinha nos filhos uma espécie de conselho muito restrito. Os eventos desta semana deixam claro, porém, que o presidente só confia mesmo na família. Para um presidente, cujo entorno é fundamental, esse comportamento é de altíssimo risco.
*Henrique Araújo,
Jornalista do O POVO.