
O professor e sociólogo Pedro Albuquerque manda para o Blog, direto do Canadá, onde faz pós-graduação, sua análise sobre o fato de nenhum deputado federal cearense estar incluido na lista dos 100 Mais Influentes divulgada pelo Diap nesta semana. Para eles, esses senhores viraram “deputados-despachantes”. Confira:
Esse resultado pode ser lido de várias maneiras. Eu lanço uma, de forma genérica, pois deve haver exceção: nossos deputados transformaram seus mandatos originários do voto proporcional em simples mandatos “distritais” despolitizadores. Pior que isso, tornaram-se deputados-despachantes de interesses atrelados a pequenos grupos sociais ou a instituições. Ou seja, são deputados que neoliberalizaram seus mandatos. Mais apropriadamente, tornaram-se representantes de pequenas porções do mercado eleitoral, topografia política essa que requer a existência de donos de feudos ou de paróquias eleitorais. É a morte dos partidos.
Desapareceu o deputado que defensor de projetos nacionais ou regionais, morreu a representaçao questionadora, polêmica, crítica, norteada por convicções. Em seu lugar, emergiu o deputado do “despacho” de interesses pontuais junto a órgãos do Estado, da pequena clientela que lhe dá sustentaçao política, o deputado sem discurso, sem idéias, sem convicções. Aliás, nossa representaçao sucumbiu ao grande consenso que o Governo, de certa forma, construiu na política nacional. Não se trata de abomínio ao consenso. Pelo contrário, o consenso é importante para a boa governança. O que se abomina é o consenso feito em versão medíocre, pois é essa que tende a permanecer e a ser validada pelo povo. A ausência do dissenso na politica ou é a sua mediocrizaçao ou sua morte.
A representaçao parlamentar no Congresso Nacional virou governista de conveniência, quer em torno de interesses privados bem específicos, quer em torno de táticas eleitorais ou de mera sustentação da governalidade sem projeto de longo alcance. São parlamentares mais do Estado que da sociedade, mais do Rei do que dos súditos. Eles não ousam, não saltam o alhambrado palaciano. Não estou a clamar pelo estilo “si hay gobierno, soy contra”. Clamo pelo exercício da autonomia do mandato popular, até porque por trás da postura de fazer prevalecer sempre o consenso está o mais arrivista objetivo de participar de “alianças ganhadoras” (não importa o que pensa e o que quer o aliado eventual; importa saber se esse aliado tem voto!).
Esse arrivismo tem três consequências trágicas para a política: uma, esta se torna mero trampolim para interesses politicos pessoais e grupais; a segunda, é a eliminação do voto como instrumento popular soberano de escolha politica, pois este perde autonomia em funçao do «grande acerto», da «grande aliança» que antecipa o resultado da disputa, pedindo-se ao povo apenas a ratificação do inevitável. A terceira é a inédita indiferenciação ideológica, pois nessa seara despolitizadora, direita, esquerda e centro tornaram-se assemelhados. O discurso ideológico reduziu-se à manipulação regida pelo princípio “não importa ser, o essencial é parecer que é”. E do povo roubaram a voz e o voto. Portanto, nesse enterro da política, não importa a felicidade, importa vencer.
Pedro Albuquerque,
Sociólogo e advogado.