
Com o título “Ó, linda Taíba”, eis artigo de Helena Lutéscia, a professora da UFC aposentada, que ficou conhecida pela pesquisa com o Citotec, medicamento para tratar pressão alta que as mulheres usavam como abortivo. Foi tirado do mercado graças a este estudo. Confira:
Em qualquer lugar do mundo a Taíba seria considerada um tesouro. Ao que parece, aqui também já houve um tempo em que se pensou assim. No final da década de 1980, personalidades das artes e da política cearense alí fizeram casas de veraneio e podia-se cruzar nas ruas do lugarejo com Sérvulo Esmeraldo e Dodora Guimarães, Inês Fiúza, Zé Porto, Pezão, Adauto Bezerra, Chez André, Roberto Câmara e outros.
Vernissages, festas elegantes, casamentos na igrejinha, associados ao charme de contar com três restaurantes franceses à época, culminaram com a criação da Festa do Escargot, da qual só resta agora um simulacro. O lugar era incensado, bem cuidado na sua rusticidade, sem que as belezas naturais fossem ofendidas pela brutalidade das intervenções urbanas. Notava-se que alguém olhava com carinho para a Taíba, mandava tapar os buracos da estrada e das ruas, cuidar da limpeza, o que se refletia na autoestima da gente do lugar, pessoas pobres e dignas, muito apegadas ao seu pedaço de paraíso.
Muita coisa mudou nas duas últimas décadas. Um inegável progresso atingiu a vida dos taibanos, com melhorias visíveis no acesso a bens e serviços essenciais. No entanto, nos últimos 3 a 4 anos, a Taíba vem sofrendo um processo de deterioração rápido e grave, que está deixando as pessoas amargas e revoltadas.
O descaso do poder público é visível no estado das ruas e no bloqueio das calçadas por blocos de cimento colocados em torno dos postes. A absoluta falta de diálogo com a comunidade no planejamento de eventos públicos tais como reveillon, carnaval, festa do escargot, festa de São Pedro, deixa os comerciantes e a população em geral à mercê das decisões tardias e intempestivas dos gestores da Prefeitura Municipal de São Gonçalo do Amarante.
Por último, a interdição da única praça para uma reforma não solicitada nem avaliada pela comunidade. O contraditório disso é a grande obra privada que está sendo construída no corredor da Taibinha, um hotel 6 estrelas, cujo impacto no entorno não é difícil imaginar. O que trará de positivo um equipamento dessa natureza ao lugar se não estiver integrado às necessidades da comunidade?
A paisagem reconhecida como cartão postal da Taíba foi entregue a essa obra. A que preço? Qual o benefício para a população? Não se enganem os investidores, a grande riqueza da Taíba é a sua população. São famílias antigas de fundadores do local, que permanecem ha várias gerações dando coesão a esse lugar e mantendo a sua identidade.
Por isso ele não foi degradado tal como aconteceu com outras comunidades praieiras da costa cearense. Por isso a pesca artesanal sobrevive; por isso a Taíba tem um grupo de teatro que se mantém ha 23 anos com esforço próprio e migalhas ocasionais do poder público. Por isso na Taíba existem projetos ininterruptos de atividade esportiva para os jovens, e outras iniciativas individuais; moças e rapazes cursando universidades e escolas técnicas e se graduando.
É burrice tratar uma comunidade como essa com descaso. A proximidade de Fortaleza, o acesso fácil por boas estradas, a disponibilidade de hotelaria tornam esse lugar ideal para a realização de eventos culturais e merece um turismo bem qualificado. Turismo que envolva o entorno da Taíba, com a linda Siupé e comunidades vizinhas, o Rio Anil, o Cumbe e tantas maravilhas pouco exploradas da nossa região.
*Helena Lutéscia
Do Grupo de Teatro Representantes da Vida (GTRV-Taíba).