
Júlia Ionele, aluna do Jornalismo da Universidade Federal do Ceará, fez do trabalho de conclusão de curso um arquivo de memórias de uma Fortaleza que já não existe mais. A estudante, que cursa o oitavo semestre da graduação, escreveu o livro-reportagem sobre o Cine Nazaré, o último cinema de bairro da capital cearense e do Brasil. O livro “Cine Nazaré – Um cinema vivo” busca resgatar a memória coletiva e afetiva do cinema.
O Cine Nazaré abriu as portas no ano de 194. Em 76 anos de funcionamento, foi palco de muitos romances, histórias e lembranças de uma Fortaleza antiga. Resistiu ao período da ditadura militar, ao avanço da tecnologia e da nova forma da organização social. Ele resiste no mesmo lugar, na Rua Padre Graça, no número 65. O espaço é uma saleta cinematográfica com capacidade para oitenta pessoas. Os filmes são projetados com retroprojetores da forma antiga e os clássicos em preto e branco que já não se encontram em quase nenhum acervo da capital.
Memória
A produção narra os 76 anos da história do Cine Nazaré, relatando a vida de Raimundo Carneiro de Araújo, o “Seu Vavá”. Ele é o responsável por manter o cinema vivo até os dias atuais e por conservar todo o maquinário da década de 20 e 30, além do acervo de duas mil películas, títulos que já não são encontrados em nenhum lugar, como O Ébrio, Dio como te amo, Carmen Miranda. O cinema do bairro Otávio Bonfim é um acervo vivo de películas do século passado.
A chegada do cinema falado na capital cearense é datada de 1930. Nesse período, a sociedade passava por mudanças decorrentes do avanço dos investimentos nas áreas de infraestrutura. As salas de cinema foram uma atração para a população. A diversão simples e acessível fez com que as pessoas passassem a frequentar cada vez mais o ambiente cinematográfico.
Os cinemas mais conhecidos de Fortaleza no período citado eram o Cine Majestic (cinema aberto em 1917, por Plácido de Carvalho, no centro de Fortaleza), o Cine Moderno (cinema inaugurado em 1921, pelo grupo Luiz Severiano Ribeiro no centro da cidade) e Cine Polytheama (inaugurado em 1911, levantado no centro de Fortaleza, hoje, no local, está funcionando o Cine São Luiz), sem esquecer a presença de outras salas mais simples, como os presentes nas associações religiosas e leigas.
O avanço da desvalorização do cinema fortalezense reflete não apenas em perdas audiovisuais, mas afetivas e identitárias. Por isso, a importância de recuperar o cinema como instrumento de identidade cultural. A reflexão sobre o cinema permite que a comunidade seja levada a pensar nele como espaço de resistência e memória.
O Livro
O livro está estruturado em quatro capítulos, cada um retratando diferentes fases da vida do cinema. O capítulo um, denominado “Nasce o Cine Nazaré”, traz informações da construção do cinema e dos primeiros anos de funcionamento. O capítulo dois, que recebe o nome “A reabertura do Nazaré”, traz a segunda fase do cinema, no final dos anos 60 e a forma de organização dele. O terceiro, “Cine Nazaré é resistência”, busca trazer a reabertura do cinema nos anos 2000 e a nova forma de funcionamento. Já a última parte do livro, denominada “Cine Nazaré vive”, procura trazer explicações do que será o Cine Nazaré nos próximos anos.
“Eu queria passar pela graduação deixando para as pessoas uma boa história que elas pudessem passar a diante, eu queria mostrar a importância de fazer jornalismo para as pessoas e o Cine Nazaré foi à concretização do sonho de fazer um jornalismo comunitário. O Cine Nazaré vive e por isso, a necessidade de retratá-lo dando oportunidade para que as próximas gerações conheçam a história de um homem que lutou para que a história do Cinema não fosse perdida. O Cine Nazaré vive”, ressaltou Julia.
O livro foi orientado por Ronaldo Salgado, professor e mestre da Universidade Federal do Ceará, o precursor da Revista Entrevista e orientador do livro Cine Diogo – O cinema azul.
(Foto – Divulgação)