
Do montanhista cearense Rosier, que desbrava o Everest, recebemos a seguinte nota, em tom de relato de sua aventura. Confira:
Caro Eliomar de Lima
Cheguei a Kathmandu no dia 31 de março, segunda-feira, às 12h45, hora local (4 horas no Brasil) – isso mesmo, hora fracionada, a hora oficial é +8h45 em relação ao Brasil. Não foi fácil chegar aqui. Decolei de Fortaleza no último dia 29, sábado, às 8 horas, e fiz uma peregrinação por São Paulo, Barcelona, Singapura e Bangkok. Somente 40 horas após decolar do Brasil, pousei em Kathmandu, capital do Nepal, a maior cidade do país e está a 1.370m de altitude.
Kathmandu é a meca dos montanhistas, e é o ponto de chegada de todos aqueles que desejam escalar o Everest e diversas outras montanhas. Depois de dois dias de voo, mais de 25 mil kilômetros voados. Agora estou a exatos 157 km em linha reta do cume do Everest, o meu grande sonho, algo em torno de 55 dias é o que me separa do topo do mundo. Na chegada, vi a Cordilheira do Himalaia que estava a direita do avião, mas o tempo levemente nublado não permitia identificar o Everest. Mas eu sabia que ele estava ali pertinho. E o melhor: me dando as boas-vindas. Eu me emocionei e o meu coração bateu mais forte.
Estou hospedado no tradicional Hotel Yak & Yeti, que abrigada a maioria dos montanhistas. Desde o estacionamento, com muitas faixas de boas-vindas até a recepção lotada de grandes mochilas bagageiras por aqui, respiramos o Everest. São montanhistas de todos os continentes e de todos os portes e experiências, algo em comum, todos com o mesmo sonho: colocar os pés no topo do mundo.
Na terça aproveitei o dia para fazer um city tour. Conheci alguns templos indus, diversas estupas budistas, com destaque para Swayambhu uma das mais reverenciadas pelos budistas. Além da poluição das ruas sem asfalto, aqui respiramos um ar diferente, uma espiritualidade que transcende os julgamentos que podemos fazer. Supera as nossas crenças e nos leva a algumas reflexões. Aqui não cabe juízo de valores, mas admiração por um povo que insiste em cultivar uma profunda espiritualidade.
Assisti a algumas solenidades de cremação que ocorrem na beira do rio, algo muito simples e objetivo. Quando a família chega ao local com o corpo em uma padiola, colocam-no sobre uma pedra, uma espécie de altar, tiram suas roupas e colocam diversas camadas de finas toalhas, respigam água no corpo, começando pelo rosto, e depois o restante do corpo. Jogam ainda um pó vermelho sobre as toalhas e, em seguida, o corpo é colocado de volta na padiola e levado para a pedra crematória, onde é colocado sobre a pilha de toras coberto com capim seco, e um homem, com uma tocha na mão, faz diversas voltas em torno do corpo antes de finalmente atear fogo. Sempre começando pelo lado da cabeça. Sem sombra de dúvidas, é uma cena forte para nós ocidentais. Porém, para os nepaleses, muito natural e rotineira e ocorre em praça pública em meio ao trânsito de muitas pessoas que circulam, e, se quer, se dão ao trabalho de olhar. A cremação dura em média três horas e é concluída com a limpeza da pedra e todos os restos de cinzas, carvão e as partes do corpo são “varridos” para dentro do rio. A pedra é lavada para ficar disponível para o próximo processo.
Todo este ritual ocorre na margem do rio sagrado Pashupatinath, onde também fica o templo Pashupatinath, dedicado ao deus Shiva. Aqui também conheci os Sadhus – os homens sagrados, e ainda recebi a bênção de um deles, nem precisaria dizer, mas foi a bênção mais rápida e barata que já ganhei. Não precisou conquista nem muita conversa, apenas US$ 1.
Na quarta-feira, dia 2 de abril, caminhei pelas ruas do distrito Tamel, ruas lotadas de vendedores “good price”, gente caminhando, carros, motos e riquixás, todos dividindo um mísero espaço com muitas buzinadas e poeira de sobra. Lojinhas minúsculas que vendem desde incensos até equipamentos eletrônicos de última geração, passando por equipamentos de escalada em alta montanha.
Ora Katmadu me lembra La Paz, ora me lembra Jacarta, na Indonésia. Mas vejo e entendo que este lugar é único e não cabe qualquer comparação, simplesmente é Kathmandu!
Cá estou eu, muito feliz e a caminho do meu, do nosso, grande sonho.
Com um abraço do tamanho do Everest.
* Rosier Alexandre.