Com o título “STF: Um ponto fora da curva”, eis artigo de Irapuan Diniz de Aguiar, advogado e professor. Ele lamenta decisão do Supremo que permite corrupto delatado defender-se em processos por último.Confira:
Ao decidir, por maioria, anular sentenças condenatórias dos corruptos, sem previsão legal, porquanto inexiste qualquer dispositivo na legislação penal ou processual penal que a tanto autorize, determinando, assim, do nada, que o corrupto delatado defenda-se por último, o Supremo Tribunal Federal concorreu para criar condições da instalação de um verdadeiro caos no judiciário em termos de segurança pública, porquanto sinalizou com o claro risco para que criminosos comuns e violentos assassinos, assaltantes, estupradores, traficantes de drogas e de armas e contrabandistas sejam beneficiados em processos condenatórios de quadrilhas, em que, sempre que um ou mais bandidos confessem e incriminem os outros.
Busca, agora, o STF, aplicar à malfadada decisão o instituto da preclusão (não pedido oportuno de direito), prequestionamento (pedido de recursos em todas as instâncias) e prova do dano pela condenação. Acontece que a preclusão e o prequestionamento somente valem para o réu ter acesso a recursos e nunca para o exercício do seu direito constitucional de ampla defesa. A consequência desta despropositada sentença em favor dos corruptos, sem, como se disse, nenhuma base legal, foi a de criar um enorme problema no capítulo da segurança pública, representado pelas referidas anulações dos processos e a possibilidade da soltura de milhares de delinquentes violentos em todo o território nacional. Este o drama por que passa a mais alta Corte de Justiça do país na busca de encontrar um mecanismo que permita apenas aos corruptos usufruir da aberrante decisão proferida. O “jeitinho brasileiro” merece a reprovação da sociedade.
Ora, é falaciosa a tese de ofensa ao princípio constitucional do contraditório e da ampla defesa do delatado, já que este direito resta plenamente assegurado na instrução processual, independentemente de sua intimação para falar nos autos. Dessa forma, não comporta a alegação segundo a qual, sob tal fundamento, a defesa seja prejudicada. Se, ‘falar por último’ já se constituía, simplesmente, uma técnica processual da autoridade policial ou judicial e não numa exigência legal, a arguição da supressão de direito se dissolve diante do avanço tecnológico hoje existente, em que, acusados e acusadores, têm acesso em tempo real, online, de tudo o que os autos contêm podendo, a qualquer tempo, se assim desejarem, peticionar, contraditar ou se manifestar, em qualquer fase da tramitação do processo, sobre fatos novos dos quais, eventualmente, não venham a ter conhecimento. A forma, por conseguinte, não há de se sobrepor ao conteúdo até porque, como enfatizado, não houve cerceamento do exercício da ampla defesa.
O temor do ‘efeito cascata’ da decisão alcançando dezenas de casos já julgados da operação ‘lava-jato’ beneficiando corruptos em prejuízo da sociedade é visível. Passando uma régua sobre o tema, o ministro Dias Toffoli,visando minimizar os efeitos propõe que só sejam revistas sentenças em que os réus acusados questionaram ainda na primeira instância o formato de apresentação de considerações finais nos processos e em situações em que fique demonstrado que houve prejuízo com essa negativa.
Cumpre, frente a esta proposta, questionar: como fica o princípio da isonomia em relação àqueles que não questionaram mas se situam nas mesmas condições?
*Irapuan Diniz Aguiar,
Advogado e professor.
(Foto – Agência Brasil)