
Em artigo no O POVO desta sexta-feira (13), o editor de Política do O POVO, Guálter George, avalia a polêmica do habeas corpus de Lula, no último final de semana. Confira:
A dura fundamentação da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, no seu pedido de investigação criminal contra o desembargador federal Rogério Favretto, aquele que mandou soltar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante o seu plantão no TRF-4, no último final de semana, inclui um aspecto que precisa de maior discussão. É no ponto em que ela aponta o passado do magistrado, de notórias e abertas ligações com o Partido dos Trabalhadores, de quem foi até filiado durante quase duas décadas, para colocar em xeque suas intenções ao decidir sobre o pedido, patrocinado por trio de parlamentares petistas.
A ideia de que o desembargador agiu em conluio com os responsáveis pela ação indica uma gravidade que exige mais elementos do que uma simples suspeita para que se sustente na linha sugerida pela procuradora Raquel Dodge. Uma autoridade do tamanho institucional que ela tem precisará agir, o tempo todo, embasada em provas contundentes. Especialmente ao decidir fazer uma acusação de magnitude suficiente para agravar um ambiente político já conflagrado a partir de inexplicáveis disputas internas que impõem prejuízos ao próprio aparelho judicial sempre que são ultrapassados os limites técnicos. É o que acontece, claramente, no caso.
Este é o fundamento mais aparente do pedido de investigação contra Rogério Favretto, acusado de prevaricação nos contundentes termos da procuradora da República. A questão que se impõe é: com base em quê? Onde estão os sinais concretos de acordo entre as partes? De que forma há como ligar o histórico petista do magistrado com a polêmica e discutível decisão tomada na sua legítima posição de plantonista naquele momento? Recuso-me a supor que a base da imputação seja um raciocínio dedutivo de Raquel Dodge.
Caso assim seja, a chefe do Ministério Público precisará abrir mais seus olhos para o que aconteceu, e tende a continuar acontecendo, à sua volta. O fato de os petistas terem escolhido a oportunidade apresentada pelo plantão de um desembargador que um dia tiveram como correligionário e de ele ser um notório crítico da Lava Jato, questionável que seja do ponto de vista ético, não embute, em si, um crime. É uma prática comum no Judiciário brasileiro e tem servido a muitos advogados para encaminharem seus pleitos com expectativa maior de que sejam aceitos, a partir de quando informados, por vias abertas ou obliquas, de quem está naquele momento respondendo pelo Judiciário. Ao que se sabe, no caso, a escala de plantonistas estava disp0nível no site do TRF-4.
De outra parte, magistrados com históricos de envolvimentos políticos ou partidários também sobram no nosso aparelho judicial.
Por exemplo, o critério que Dodge usa para pedir a investigação, aplicado de maneira solta, indicaria como ilegal qualquer decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, que envolva o PSDB, do qual foi filiado por anos, governos tucanos, dos quais já participou, ou a gestão Michel Temer, da qual saiu diretamente para a cadeira na principal corte do País. Um equívoco, por mais que o modelo de indicação precise ser mesmo revisto.
Rogério Favretto, com seu petismo histórico, não pode ser transformado em exemplo isolado dentro de um quadro no qual é, apenas, mais um. O parâmetro apontado para questioná-lo abre uma dúvida que vai além daquele plantão e não diz respeito apenas ao caso Lula.